Ode à senhora do sobrado
Moises silveira de menezesapareça no terraço
deixe que a brisa brejeira
bata leve seus cabelos
que lembram trigais maduros
ondeando sobre as coxilhas.
Descanse o olhar sereno
na placidez da cidade,
ouça o vento em contraponto
ao murmurar das ramagens,
em melíflua sinfonia
num concerto singular.
Senhora, bela e amável
dia desses, num relance
lhe percebi com deleite
a silhueta grácii, frágil
passeando na praça calma
sobre um andar de gazeia,
pois, saiba distinta dama,
que esse sorriso de aurora
em ténue luz de candil,
formata linda gravura
num quadro de lua nova
nas mornas noites do pago.
E também foi num repente
que meus olhos madrugueiros
perpassaram seu recato
por uma pequena fresta,
em meio a sete botões
de uma blusa de algodão
sete vezes bem fechada,
pra pousarem seresteiros
levando os dedos da alma
num afago imaginário
à candura de seu colo,
de alba-rosado matiz.
Outras vezes a percebo
cabelos lourando ao vento,
gestos calmos, comedidos
absorta, desprendida,
a seda branda do rosto
dourando na luz divina
de uma réstia distraída
que o sol lhe dá por moldura
para compor, fulgurante,
um perfil de deusa grega
que veio adornar a pampa
nos cultos da primavera.
Senhora, talvez não saiba
mas há uma cálida névoa,
meio bruma, meio nuvem
a lhe envolver a silhueta
que em suaves meneios lembra
esguias garças ariscas
num bailado sonolento
sobre sutis aguapés.
E mais ainda, senhora!
Vos elegi minha musa,
vestal guardiã dos desvelos
E do amor que me acomete.
Senhora, entendo esconder
nesse vetusto sobrado
seu recato de romance
num quadro de dama antiga,
pois, meus olhos predadores
transpassam esses resguardos
varando sensuais recantos
pra recolher em segundos
envolta em véus de mistério,
imagem doce de fêmea
em bulícios harmoniosos
nos férteis cios de setembro.
Senhora dos meus enlevos,
apareça no terraço
desse sisudo sobrado
onde por vezes se esconde.
Preste atenção neste canto
que nasceu em noite insone
para prantear seu silêncio
e o claustro no casarão.
Senhora, musa encantada,
conceda-me um só sorriso
e abandone esse retiro,
pois, viverá neste poema...