Di função

Já ouviu falar do neno?

Di função
O Neno era sem pai, a mãe que te sustenta.
Sofredora, mas não se lamenta.
Trabalha em casa de família para não passar fome.
O Neno era pivete, hoje tá um homem. Então...

Capão Redondo, só cara de chão.
Num barraco de madeira entre o esgoto e o lixão.
Extremo sul, distante da cidade.
Ali mora o descaso, a realidade.

A maioria preto e nordestino...
...em São Paulo, sem destino.
Criado na rua e sem direito a nada,
Neno, mais um moleque da quebrada.

Oitenta e sete, me lembro bem,
sua mãe desesperada vendo o filho na FEBEM.
Parou com a escola, se viciou...
...resolveu sair de casa, o que adiantou?

O Neno tá crescendo,
sua mãe segue lutando,
as coisas tão difícil,
dinheiro tá faltando,

Ele olha a sua volta
e a revolta só agrava,
sentimento de culpa
o Neno acumulava.

Sem dignidade,
sem estrutura,
doze de idade
enfrentando a vida dura,
viveu na pele,
passou vários 'veneno',

...já ouviu falar do Neno?

Os 18 chegou,
ganhou maioridade.
Filho criado sem pai
em meio às dificuldades.

A sua mãe serve a Deus numa igreja cristã,
e o Neno no crime cheirando até de manhã.

A vida deu a ele valores desiguais,
a sua dor não era filme, os corpos são reais.
Capão Redondo, 3 da madrugada,
moleque é metralhado, tá morto na calçada.

Era o retrato da rua, assim como é.
Finado Quinho, neguinho do Jardim Imbé.
Fiquei sabendo que uns caras tavam na sua bota,
um justiceiro sangue-ruim, ex-polícia da ROTA.

Desacreditadão tava o Neno, rapaz.
Só pra cima e pra baixo, de Suzuki, no gás.
Criminoso quer IBOPE, quer mostrar que tá bem,
até chegar o DEPATRI e tomar tudo o que tem.

E por aí o Neno vai, empolgado no sucesso.
".40" e Glock é fácil acesso.
Seu mundo agora é esse aí,
não tinha mais jeito.
Um caminho sem volta,
o que tá feito tá feito.

E por aqui o Neno é rei é o herói da molecada,
mas tem covarde na maldade armando cilada.
A inveja é uma merda. Mas tá valendo...

...já ouviu falar do Neno?

Aliadão de um mano lá, um tal de Davi.
Disse pra mim que é sangue-bom, até então nunca vi.
De vez em quando ele cola numa sete galo-preto,
é correria no dinheiro, se adianta numas treta.

Ele é um cara firmão que se deu sempre bem,
ouro no pescoço à custa de alguém.
Tem fama de patrão, sai com várias mina.
Negócio lucrativo, boca de cocaína.

Tá pela ordem, né? O Neno é o gerente,
toma conta da favela e abastece os cliente.
Dinheiro fácil é fácil, vai fácil também.
Soldado do tráfico morto cito mais de cem.

Talvez fosse pro Neno sua última opção,
será que o esforço da sua mãe foi em vão?
Repara só nos pivete quando o pai é ausente:
sem dinheiro, a mesma merda, Natal sem presente.

Infância infeliz, futuro duvidoso.
Nascem, morrem num ciclo vicioso.
O Neno agora leva uma, tem dinheiro pra gastar:
festa, vagabunda, roupa de marca e pá.

Veja só, olha só como é o destino,
foi te empurrando pro crime no desbaratino.
Morrer dessa forma? Não, não. Não tô podendo...

...já ouviu falar do Neno?

O Neno tá pedido, fugido da quebrada.
Ripou um pilantra na semana passada.
O boato rolando e o seu nome envolvido:
"Traficante da sul deixa outro estendido".

É mau pro Neno, só resta uma saída:
sair fora do crime e a passagem de ida.
Mas não, ele insiste, quer viver nesse drama.
Desavenças deixa quieto, o problema é a grana.

O futuro é indiferente, já não importa mais.
Envolvido até o pescoço, agora é tarde demais.
Jurado de morte na mão dos gambé,
abandono dos comparsa, sei lá qual que é!

Destacado dos rolê dos amigos de infância,
pressentindo algo mau, o Neno vive à distância.
Armado, ligeiro com quem se aproxima,
se liga só naquele Tempra que virou a esquina.

Subindo, tá vindo na sua direção,
com três maluco dentro. - "Aí, Neno, sei não..."
Ele tentou reagir, não dava mais pra correr.
Depois de vários que matou, chegou sua vez de morrer.

Vinte e poucos anos se acabaram assim,
morto a tiros de pistola, pro Neno era o fim.

Vai vendo... já ouviu falar do Neno?

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